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CNJ decide se Juiz Marcos Scalercio será afastado preventivamente do TRT em SP

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, pautou para a tarde desta terça-feira (5) reunião para decidir se abre um Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) para investigar o juiz substituto Marcos Scalercio por causa das denúncias de que ele cometeu assédio sexual contra ao menos três mulheres em São Paulo.
Os casos foram revelados em agosto deste ano pelo g1. Em 2021, eles chegaram a ser arquivados por duas vezes pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2) em São Paulo. Naquela ocasião, a corregedoria do órgão paulista alegou que não havia provas de que Scalercio havia cometido crimes sexuais. E por isso o PAD não foi aberto contra o juiz.
À época, uma aluna do cursinho Damásio Educacional, onde Scalercio dava aulas, uma advogada e uma funcionária da Justiça do Trabalho o acusavam pelos assédios. Elas tinham dito que o professor e juiz as abordou, respectivamente, numa cafeteria próxima ao curso, nas redes sociais e dentro do gabinete dele no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, na Barra Funda, Zona Oeste da capital paulista.
Scalercio sempre negou esses crimes, alegando inocência, segundo seus advogados, que farão a defesa dele nesta terça no Conselho Nacional de Justiça. Segundo a assessoria de imprensa do CNJ, a previsão é a de que a sessão comece por volta das 14h. Ela será transmitida ao vivo pela internet, nas redes sociais do órgão.
Além da discussão sobre a abertura ou não do PAD contra o magistrado, os 15 integrantes do CNJ poderão votar ainda se afastam preventivamente Scalercio do TRT-2. O relator, corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, pode sugerir as duas possibilidades ao plenário.
Ante a gravidade das acusações, a repercussão do caso e a importância de se manter íntegra a atuação da toga, espera-se que o Conselho Nacional de Justiça promova a abertura do Processo Administrativo Disciplinar, com o afastamento preventivo do requerido. A dignidade da magistratura e a importância de suas decisões não deve conviver com situações nebulosas envolvendo um dos seus membros", disse o advogado José Lúcio Munhoz, que defende os interesses de uma das três vítimas."
O CNJ pode também colocar em votação se sua Corregedoria irá investigar mais acusações de crimes sexuais que surgiram contra o juiz após a repercussão do caso na imprensa. Até a última sexta-feira (2), o Me Too Brasil havia contabilizado um total de 96 relatos com denúncias, seis deles de estupro. Algumas das denúncias são de 2014 a 2020.
O movimento Me Too tem parceria com o Projeto Justiceiras. Os dois órgãos prestam assistência jurídica gratuita a vítimas de violência sexual. Eles já encaminharam 62 desses casos para conhecimento das autoridades, entre elas, o próprio CNJ.
Segundo Luanda Pires, diretora de relações institucionais do Me Too Brasil, o número de vítimas que acusam o magistrado por assédio pode ser maior. “A gente já sabe de muitas outras vítimas, que ainda não estão dispostas, não têm condições ainda de falar sobre, mas a gente já sabe de outras mulheres. A sociedade brasileira naturalizou esse crime, entendendo esses atos como 'cantadas'.”
Além do Conselho Nacional de Justiça, o Ministério Público Federal (MPF), em São Paulo, analisa atualmente as três acusações anteriores de assédio sexual que a Corregedoria do TRT-2 havia arquivado por duas vezes no ano passado.
Esses casos também são apurados nas esferas administrativa e criminal. Os dois procedimentos estão em sigilo e ainda não têm uma conclusão. No aspecto criminal, condenados por assédio sexual podem ser punidos com até dois anos de prisão.
Ex-alunas do Damásio Educacional usaram as redes sociais em agosto para dizer que, pelo menos desde 2016, já haviam procurado o cursinho e denunciado Scalercio por comportamento inadequado. Entre as queixas relatadas estavam convites do docente para sair com as estudantes e envios de mensagens inapropriadas com conotação sexual para as redes sociais delas.
O Damásio, onde Scalercio era professor de direito no cursinho preparatório para concursos públicos e para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o desligou da instituição em agosto, após as denúncias contra ele aumentarem. O cursinho sempre negou, no entanto, que soubesse de relatos de assédio sexual envolvendo ele e alunas.
Na segunda (5), o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, em São Paulo, informou que sua Corregedoria transferiu Scalercio do Fórum Ruy Barbosa para o Fórum Trabalhista da Zona Sul da capital. O magistrado retornou ao trabalho após ter tirado férias durante a repercussão das denúncias de assédio sexual. Além da mudança de local, ele não irá mais participar de audiências.
A Corregedoria do TRT-2 também abriu, na semana passada, uma nova Reclamação Disciplinar (RD) contra o magistrado, desta vez para apurar mais três denúncias contra ele. O tribunal não informou, porém, quais são essas novas acusações, alegando que seu teor está em sigilo.
A Reclamação Disciplinar é apurada pelo corregedor do TRT para saber se há indícios para se instaurar um Procedimento Administrativo Disciplinar contra o juiz.
O Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal no Estado de São Paulo (Sintrajud) realizou um protesto na segunda em frente ao fórum em que Scalercio trabalhava, na Barra Funda. Servidores distribuíram panfletos com a frase "assédio não" para pedir o afastamento preventivo do juiz. Eles afirmam que o magistrado não tem condições de continuar atuando no Tribunal Regional do Trabalho depois das denúncias de crimes sexuais.
Assédio sexual é crime no Brasil. Pode ocorrer em um contexto em que há relação hierárquica entre o agressor e a vítima, no qual ele a constrange, geralmente no ambiente de trabalho, seja usando palavras ou cometendo ações de cunho sexual, sempre sem o consentimento da pessoa, como um beijo ou um toque forçados, por exemplo.
MP ouve vítimas de estupro
Segundo o Me Too, as vítimas de Scalercio são alunas do Damásio, advogadas e servidoras do TRT. Quatro dos casos de estupro foram encaminhados ao Ministério Público (MP) de São Paulo. As outras duas mulheres que disseram ter sido estupradas por Scalercio não quiseram levar as denúncias à frente.
"É importante alertar a todas as mulheres a importância de falar. São relatos muito doloridos, graves. Relatos de sofrimento. Relatos que causam muita repulsa em que ouve. É um tipo de violência insidiosa e perversa. Ela se vale da condição de vulnerabilidade dessas mulheres", disse ao g1 a promotora Silvia Chakian, que ouviu algumas das mulheres. Ela integra o Núcleo de Atendimento às Vítimas de Violência (NAVV) do MP.
Ainda no final de agosto, após a repercussão do caso envolvendo Scalercio, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), com sede em Brasília, instituiu a "Política de Prevenção e Combate ao Assédio Moral e ao Assédio Sexual". A ação ocorrerá em todos os tribunais do TST e também no Conselho Superior da Justiça do Trabalho.
fonte: G1.